Lei Guilherme Lima: Alerj debate protocolo antirracista após caso de racismo em escola de Maricá
A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) está discutindo a criação de um protocolo para o enfrentamento do racismo e da intolerância religiosa nas escolas públicas e privadas do estado. A proposta, que tramita na Casa sob o número PL 1529/2023, foi batizada de Lei Guilherme Lima, em homenagem ao jovem de 14 anos que tirou a própria vida após sofrer bullying racista em uma escola estadual de Maricá.
O caso, ocorrido em 2022, provocou comoção em todo o estado e acendeu um alerta sobre a ausência de medidas eficazes para lidar com o racismo nas instituições de ensino. Durante audiência pública realizada nesta segunda-feira (19/05), a Comissão do Cumpra-se, presidida pelo deputado Carlos Minc (PSB) – autor do projeto –, ouviu especialistas, autoridades e familiares de Guilherme.
“Assim como aprovamos a Lei Maria da Penha nas Escolas, para que os estudantes aprendam a combater o machismo desde cedo, agora precisamos de um protocolo que ajude professores a reconhecerem e enfrentarem o racismo no ambiente escolar, evitando que tragédias como a do jovem Guilherme se repitam,” declarou o parlamentar.
Mãe de Guilherme faz apelo emocionado
A audiência teve um momento comovente com o depoimento de Marinês Lima, mãe do adolescente, que relatou a dor de perder o filho e a luta por justiça.
“Sempre dizem que sou uma mulher forte porque, desde o primeiro momento, consegui falar em público e cobrar por justiça, mas é o amor que me move. Luto pelo Guilherme e por todas as outras crianças porque meu filho chegou ao limite e tirou a própria vida, mas desejo que nenhuma outra criança precise fazer o que o meu fez. Mas eu, sozinha, não sou ninguém, precisamos nos unir. Não posso deixar que o mesmo sistema que executou meu filho me cale, vamos ter que lutar. Já enterrei meu filho, mas não quero que nenhuma outra mãe passe por isso”, desabafou.
Enfrentamento precisa ser coletivo
O debate contou com a participação de representantes das áreas de educação, justiça e assistência social. A deputada Zeidan (PT) defendeu que a resposta ao racismo deve ir além da punição. “Muitas vezes, quem pratica o bullying também é vítima de uma estrutura violenta. Por isso, não basta punir, é preciso também educar e transformar”, disse ela, destacando a necessidade de uma ação conjunta entre escolas, saúde mental, assistência social e sistema de justiça.
Formação e reconhecimento do racismo
Monique Rodrigues, da Superintendência de Promoção da Igualdade Racial (SUPIR), ressaltou que é preciso formar educadores para reconhecer práticas racistas que muitas vezes passam despercebidas. “Nosso papel é esmiuçar essas práticas e promover a formação dos profissionais da educação para que reconheçam e enfrentem essas violências no cotidiano escolar”, explicou.
Na mesma linha, Joana Raphael, da Secretaria Estadual de Educação, afirmou que o compromisso com uma educação antirracista deve ser compartilhado por toda a sociedade. “O que aconteceu com o Guilherme não foi um caso isolado. Há outros, e não podemos continuar tratando como se fosse apenas bullying. É racismo, e precisamos nomear. Essa responsabilidade é de todos nós”, afirmou.
Mudança no perfil da violência entre jovens
A juíza Cláudia Maria Motta, da Vara da Infância do TJRJ, apontou que os atos infracionais cometidos por adolescentes têm se tornado mais violentos e incentivados por redes sociais. “As redes elevaram o bullying a outro patamar. Temos adolescentes queimando pessoas em situação de rua, filmando e postando em tempo real, além de alunos organizando ataques a colegas por meio de plataformas como o Discord. Tudo isso faz parte de um novo contexto que precisamos enfrentar e o racismo está no centro dessa discussão”, disse.
Também participaram da audiência o deputado Fred Pacheco (PMN), a delegada Rita Salin (DECRADI), Joana Oscar, da Gerência de Relações Étnico-Raciais da Secretaria Municipal de Educação, e Luiz Eduardo Negrogum, do Conselho Estadual de Direitos do Negro, entre outros representantes.